Mais Um Escandalo No STF
- MOSTB Editora

- 24 de out.
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Esquema sob investigação
A Polícia Federal investiga um complexo esquema de venda de decisões judiciais que alcançaria gabinetes de ministros do STJ. Trata-se de suspeitas de negociação de votos, minutas de decisões e influência irregular em processos, com participação de lobistas, advogados, servidores do tribunal e desembargadores.

Segundo os investigadores, o esquema está entre os mais sofisticados já apurados no Poder Judiciário brasileiro não mais atos isolados, mas uma rede estruturada de atuação para garantir resultados judiciais favoráveis mediante pagamentos e facilitação de acesso a decisões ainda em andamento.
Um dos nomes centrais é o do lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, referido como “lobista dos tribunais”. A PF apurou que ele mantinha acesso privilegiado a minutas e decisões em tramitação no STJ, e negociava com advogados e clientes a obtenção de resultados judiciais desejados.
Além dele, advogados que formalmente representariam os “clientes”, servidores do STJ que ocupavam cargos estratégicos em gabinetes de ministros, e desembargadores estaduais também aparecem entre os investigados. Por exemplo, três servidores do STJ já foram alvo de busca e apreensão.
A investigação aponta para diferentes formas de atuação no esquema:
Vazamento ou alteração de minutas de decisões antes de serem publicadas, favorecendo determinados interessados. Exemplos mostram que o servidor Márcio José Toledo Pinto teria alterado ou excluído minutas em benefício do lobista Andreson.
Lavagem de dinheiro e uso de “contas de passagem”, saques em espécie fracionados, transferência para pessoas físicas ou jurídicas “laranjas”.
Pagamentos substanciais atribuídos à compra de decisões ou ao acesso privilegiado a processos: em um diálogo, Andreson teria afirmado que obteve aproximadamente R$ 19 milhões em processo ligado ao grupo JBS S.A. / J&F Investimentos.
Por exemplo, em relatório parcial da PF, constam transferências de cerca de R$ 2,625 milhões entre 2019 e 2023 a um motorista vinculado ao lobista, via empresa controlada por ele, o que levantou suspeitas de estrutura de ocultação de propinas. O caso obteve grande repercussão porque ultrapassa tribunais estaduais e alcança o STJ: ao menos quatro gabinetes de ministros da corte foram mencionados nos relatórios da PF embora até o momento nenhum magistrado tenha sido formalmente investigado como réu.
O assunto tramita em segredo no Supremo Tribunal Federal (STF), uma vez que há menção a servidores do STJ e, potencialmente, irregularidades que envolvem instâncias de foro especial.
A PF já deflagrou operações específicas como a Operação Sisamnes para cumprimento de mandados de busca e apreensão, sequestro de bens (ordens de bloqueio de dezenas de milhões de reais), afastamento cautelar de servidores e monitoramento de pessoas envolvidas.
Inserção do caso de Catarina Buzzi
A investigação da PF também menciona Catarina Buzzi, advogada e filha do ministro Marco Aurélio Gastaldi Buzzi (STJ). O relatório parcial anexado ao inquérito sigiloso aponta para indícios de repasse de cerca de R$ 1,12 milhão a ela.
Segundo as mensagens encontradas no celular do lobista Andreson, há um diálogo em que uma pessoa identificada como Carlos Chaves informa ter transferido R$ 1.120.000,00 para “a sua conta e da Catarina Buzzi”, cobrando restituição sob a alegação de que “a promessa de trabalho não foi cumprida”. Nessa mesma imagem, consta um comprovante de transferência de R$ 500 mil, classificado como “pagamento de honorários”.
O relatório ressalta que o conteúdo que envolve Catarina pode ser remetido a procedimentos autônomos, dada a complexidade e ramificação das investigações, com análise especial em unidades jurídicas distintas para garantir eficácia e evitar contaminações.
Em relação às conexões empresariais, a PF aponta vínculos entre Catarina, o advogado Roberto Zampieri (morto em 2023) e o empresário Haroldo Augusto Filho (sócio da Fource), empresa já investigada por suspeita de compra de decisões no STJ e em tribunais estaduais. Em mensagens de outubro de 2022, Catarina escreveu a Zampieri: “Dr. Roberto! Tomei a liberdade de pedir seu número ao Haroldo. Agora está na agenda. Foi um prazer reencontrá-lo.” Zampieri respondeu com cordialidade. Haroldo, por sua vez, teria afirmado em diálogo anterior ser “amigo da mãe e da filha” do ministro Buzzi.
A defesa de Catarina Buzzi reagiu negando qualquer irregularidade, afirmando que ela nunca atuou em processos da Fource, de Andreson ou de Carlos Chaves, e que não recebeu nenhum pagamento dos envolvidos. A nota também declara que ela não conhece essas pessoas. A defesa acrescenta que ela não é formalmente alvo de investigação no STF ou em outra instância até onde se tem conhecimento.
O ministro Marco Buzzi, por meio de nota da assessoria do STJ, afirmou que não acompanha as relações comerciais de sua filha ou de qualquer advogado, e ressaltou que as pessoas citadas “não fazem parte de nenhum processo sob sua responsabilidade”.
O lobista Andreson permanece preso, e o STF manteve sua prisão preventiva, considerando a gravidade das acusações e o risco de interferência nas investigações.
O STJ já demitiu o servidor Márcio Toledo, após processo administrativo que concluiu que ele “revelou segredos a que tinha acesso e valeu-se do cargo para proveito pessoal”.
O STJ afirmou que nenhum ministro está sendo investigado formalmente até o momento, e que os afastamentos se deram
em relação a servidores.
A PF pediu prorrogação do inquérito, afirmando que o esquema é “consideravelmente mais sofisticado e complexo do que os investigadores inicialmente avaliaram”.
Do ponto de vista institucional, o episódio reacende preocupações sobre a integridade do Poder Judiciário brasileiro, especialmente nas instâncias superiores. A possibilidade de venda de decisões judiciais em tribunais de alta relevância gera desgaste à confiança pública.
Linha do tempo da investigação
Outubro/2024: Servidor do STJ afastado após investigação de venda de sentenças.
Novembro/2024: A PF deflagra mais uma fase da Operação Sisamnes, visando gabinetes do STJ.
Maio/2025: Nova fase da operação, com mandados em três estados, sequestro de bens da ordem de R$ 20 milhões.
Maio/2025: Prisão de cinco suspeitos ligados ao assassinato do advogado/operador que atuava no esquema, revelando conexão com atividades criminais mais amplas.
Outubro/2025: A PF abre investigação autônoma sobre a relação entre o lobista e a JBS, com menção a R$ 19 milhões em mensagens.
Ainda que a investigação tenha revelado elementos robustos minutas vazadas, servidores demitidos, valores milionários é importante ressaltar que não há até o momento condenações definitivas relacionadas a esse esquema no STJ. O caso segue tramitando sob sigilo no STF.
Além disso, a menção de ministros ou gabinetes não implica automaticamente culpa — o processo investigativo ainda precisa confirmar autoria, materialidade, vínculo de corrupção, lavagem de dinheiro, etc. Para a sociedade, porém, permanece o desafio de garantir que a Justiça funcione com transparência e integridade.
Texto: mostb.com
Fonte: Jornal Grande Bahia (JGB)+2Revista Oeste+2 ODia



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